segunda-feira, 16 de maio de 2016

Sobre a forma de nascer

Eu comecei o pré-natal já passava dos 3 meses de gestação. No SUS, precisa aguardar. Estamos lotados. Eunão tinha como aguardar. Já havia deixado que muito tempo se passasse.

Procurei médico particular. Não tinha plano de saúde. A agenda livre mais próxima era daquele mesmo ginecologista-obstetra que me falou no início da gestação  "é só um bebê".

Comecei pré-natal com ele. Um tempo depois consegui a consulta pelo SUS. Mas eu não conseguia largar do médico que  comecei o pré-natal. Agora vejo como exagero. Na época não. Eu tenho pé atrás com médico, precisava ouvir mais de um. Não tinha como descuidar, negligenciar, correr riscos com a gestação a partir dali. Precisava garantir que tudo corresse bem. Talvez fosse a insegurança, reflexo do não desejo. Não sei, seu que foi assim.

Quando a casa engravidou a primeira vez fiz algumas leituras sobre parto e cesárea. Os dois são forma de nascimento, mas cesárea não é parto (há discordâncias, mas eu compreendo assim). Assisti vídeos de parto humanizado, parto domiciliar, parto natural gêmeos.

Ah, os partos domiciliares. Eram lindos. Mas uma realidade muito distante. Imagina, eu parindo em casa? Não, não era pra mim.

Conversei com o GO (ginecologista obstetra) sobre parto, cesárea e valor. Fiquei escandalizada ao descobrir que o acompanhando do trabalho de parto e parto normal era muito mais cara do que a realização da cesárea. Como assim mais caro? Simples, se tu entrares em trabalho de parto início da manhã eu preciso cancelar toda minha agende, até o bebê nascer. Tu paga pelo meu tempo. A gente paga pelo tempo do médico para que ele nos acompanhe naquilo que nosso corpo sabe fazer desde sempre. Parir!

Decidi que continuaria com o acompanhamento do pré-natal particular (e pelo SUS também, quanto exagero) e o parto seria pelo SUS. Olha, o hospital da ULBRA em Canos é muito bom. E algumas outras sugestões de lugares surgiram. Não. Eu vou parir no Hospital Centenário, quero que menino nasce em São Leopoldo. Cidadão Capilé. No Centenário? Sim. No Centenário.

Aquele desejo de um parto longe do hospital permanecia na minha cabeça. Sem intervenções. Cria no colo logo depois de nascer, sem procedimentos invasivos. Mas tudo bem. Isso não é pra mim.

Mas como eu vou saber a hora de ir para o hospital? E se eu for muito cedo e for submetida a uma cesárea desnecessária? E se eu sofrer violência obstétrica?

É horrível a sensação de medo da violência obstétrica. Em uma hora tão significativa da vida gente. Da vida da mãe que nasce, da vida da criança que nasce, a gente ter medo de ser violentada. No início da vida, quando a gente devia ser acolhida, a mãe e a criança que nascem, temos medo de ser violentadas. Eu tinha medo de ser violentada. Tinha medo de ser enganada. Passada para traz. Machucada. Tinha medo.

É triste que a via de nascimento seja, muitas vezes, determinada por esse tipo de medo. Medo de ser maltratada. Eu sabia da importância do trabalho de parto para a vida do bebê, para a vida da mãe. Eu sabia de muitas coisas que nós dois ganharíamos passando por essa experiência. Eu tinha curiosidades. Eu queria saber como era a dor do parto. Eu queria encontrar a partolândia. Eu queria parir!

Como vou fazer? Uma Doula! Uma Doula pode me acompanhar no início do trabalho de parto em casa. Depois vamos para o hospital. Perto da hora de nascer. É só chegar no hospital e pronto. Eu não lembro como cheguei até a Anita, mas cheguei. Marcamos uma conversa. E ela ascendeu uma luzinha de possibilidade de parir em casa. Me contou dos partos dos filhos dela. Da equipe que a acompanhou. Da possibilidade de parcelamento no pagamento. Eu queria parir! Eu nuca gostei de hospital.

Eu já estava com 33 semanas. Menino crescia na barriga. Marquei consulta com GO do parto humanizado. Mais um médico, um novo olhar sobre o pré-natal. E eu, ao invés de abandonar os outros dois, continuei com os três. Que tamanha insegurança, fico pensando agora! Que tamanho medo! Que tamanha falta de confiança, neles ou em mim, não sei.

Contei história inteira. Não te preocupa com isso. Muitas mulheres que fazem inseminação artificial também se sentem inseguras quando tem a confirmação de estarem grávidas.

O médico fez perguntas diretas. Eu senti como se ele quisesse colocar a prova meu desejo de parir fora do hospital. Acho que maior que o desejo de parir em casa era o de parir longe de um hospital.

Eu queria parir. Sentia que precisava viver aquela experiência, mas não sabia dar nome aos sentimentos. Não sabia falar deles de coração aberto. Não sabia falar. A garganta dava nó. O olho enchia de água.

E o parto Vanessa? Vou parir aqui na sala dos professores. Estarei trabalhando e... Ops... Nasceu! Brincava com as colegas. Essa louca, capaz de ganhar esse guri em casa! Eu ria e dizia "o corpo sabe parir gurias, foi feito para isso." Eu tinha certeza de que o corpo sabia parir.

Li muitos relatos de parto. Assisti vídeos. Me informei sobre o que poderia dar errado em um cesárea, quais eram as falsas indicações de cesárea.  Texto da Melania Amorim falando das indicações reais e fictícias de cesáreas.

O Grupo Nascer Sorrindo, no facebook, foi outra fonte de informações muito importante. Li fragmentos do livro Quando o corpo consente, e também do livro Entre asorelhas: histórias de parto do Ricardo Jones. Além de muitos textos em blogs e sites espalhados pela internet. Conversei muito com uma amiga que tinha parido em casa, dentro d'água.

O corpo sabe parir. Eu tinha certeza disso. Mas tinha também medos. Medo daquilo que eu desconhecia. Algumas vezes pensava se aquilo tudo daria certo. Tinha a sensação de não me sentir merecedora daquela experiência. Não sei se a expressão é bem essa. Mas tudo bem, o corpo sabe parir.


Não consegui assistir ao documentário O Renascimento do Parto, nem O Parto orgásmico. Durante alguma consulta com o Ricardo Jones (GO do parto humanizado), falando sobre as pessoas que acompanhariam o trabalho de parto, ele comentou que o parto era como o sexo. O que acontece se duas pessoas estão transando num quarto escuro e alguém abre a porta e liga a luz? É o mesmo que acontece durante o trabalho de parto! 

Parto é sexo. Parto é empoderamento! Eu tinha muita expectativa de que parir seria um ato libertador pra mim. Eu queria muito chegar na partolândia!

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