sexta-feira, 3 de junho de 2016

O demorado primeiro colo de mãe

A primeira "mamada"
Estevan veio. Veio pro colo. Eu não conseguia me mexer direito e ele ficou ali, todo molinho, pequenininho
deitado no meu braço!

E logo fomos para o quarto. E mais uma vez o medo de ter alguém me trocando de cama. Cama - maca - cama - maca - cama! Mas era um medo diminuído agora pelo menino ia ao meu lado.

Ele não tinha mamado ainda. Muitas horas se passaram e ele ainda não tinha mamado. Era um dos motivos de eu preferir que ele nascesse em casa. Era um dos motivos de eu querer que ele nascesse de parto normal.

Cristofer, Iuri e Julia estavam ali com a gente. Ajudaram na primeira mamada. Eu lembro ainda, direitinho a sensação da primeira vez que ele colocou a boca na teta. Tem vídeo também. Ainnn. Eu disse quando ele conseguiu segurar a teta com a boca pela primeira vez. Ele ali, tão pequeno. Deitado do meu lado. Tão tão tão pequeno. Tão indefeso, tão precisado dos meus cuidados.

E é tão rico me emocionar agora lembrando daquele momento. Me encher de uma emoção que, lá, há dois anos atrás parecia tão adormecida. Adormecida pelos hormônios sintéticos, pela anestesia, pelo cansaço, pelo protocolo. Adormecida pelos caminhos da vida.

Ele ficou um tempo ali, cheirando a teta. Ainda sem leite. Ainda sem colostro. Toda mole. Tão grande.
A teta, aquela que veio substituir o cordão umbilical. Que se preparava para alimentar com leite, um menino, que até então se alimentava e respirava pelo cordão umbilical. Que ganhava vida pela placenta.

A placenta é mística. Mítica. Transcendente. Fonte de energia. Estou certa que sim. Essa placenta que alimentou Estevan por 39 semanas é, também, luto para mim. Sabe aquele momento que a gente perde e que nunca mais vai ser possível viver? Pois é. Outra frustração. A placenta. Eu não vi. Não coloquei a mão. Não apertei. Não senti o cheiro. Não comi. Nem ao menos sei onde ela foi parar. E, nessas condições prefiro mesmo não saber. Deixo ela guardada na memória. Uma imagem, sem imagem, sem cheiro.

Minha placenta de argila.
Eu não vi a placenta e Estevan não teve o privilégio de ter o cordão umbilical cortado somente após parar de pulsar. Outro motivo pelo qual eu queria parir. E parir em casa.

Quem sabe, se houver próxima gestação, eu opte por um parto de lótus? Ai posso curtir bem a placenta. Enquanto isso lembrei da argila que comprei no final da gestação e que tinha a intenção de moldar a gestação. Eu paro o texto. Encontro a argila (...). Agora temos uma placenta! De argila. Mas temos.

Eu continuava lá na cama. Não pode erguer a cabeça, não pode se mexer, fez anestesia. Vai passar mal. Fiquei ali. Deitadinha, com menino ao lado, interagindo com a teta. E tive que ficar sozinha com menino. Não pode acompanhante. Acompanhante queria ficar. Eu também queria ficar acompanhada. Não pode.  Pedi que ele fosse embora, não porque eu queria ficar sozinha com o menino, mas porque eu tive medo de sofrer represálias caso a gente questionasse as regras do hospital. Por isso também eu queria parir em casa.

Por volta das 4 horas da madrugada, chega uma trabalhadora da saúde. Não tomou banho ainda? Porque? Nem deu tempo de dizer que me mandaram não me mexer. Levantei, tomei banho. Com ajuda para pôr a roupa. E seguimos ali, deitados lado a lado. Menino e eu. E se eu durmo e aperto ele? E se deixo ele cair? E se ele chora? E se ficar com fome? Mas eu sabia que me leite ia descer, o trabalho de parto, se não valeu para parir, valeu ao menos para o leite descer, pensava eu.

As trabalhadoras da saúde ainda tentaram dar leite num copinho para ele. Eu não estava deixando, mas não e que uma delas entra no quarto bem na hora em eu vou no banheiro. Quando volto, está ela com Estevan no colo e o copinho não mão. Ele não tomou. Não era para ele tomar. Ele ia mamar quando fosse a hora. Ele ia mamar. Eu já não pari. Ele ia mamar, no peito.

Logo começaram as dores. Dores musculares, das mais de 24 horas de trabalho de parto. Dores da alma, de um corte feito na barriga. Eu tinha um bebê para cuidar, um corte na barriga para cicatrizar e uma ferida imensa na alma, acompanhada de um sentimento maior ainda de incompetência. O corpo sabe parir, mas o meu corpo não pariu.

Apesar disso, sobrevivi aos dias no hospital. Cuidei do Estevan. Subi e desci da cama, fui ao banheiro. Tomei banho. Juntei coisas que deixei cair no chão. Com o cordão do soro ligado ao meu braço. Recebendo medicação por SUSPEITA de infecção. Procedimento padrão. Por isso também que eu queria parir em casa. Para ficar livre dos tais procedimentos padrões.


 Estevan nasceu na sexta a noite e voltamos para casa na segunda pela manhã. Fazia frio, e fazia sol.